sexta-feira, 12 de julho de 2019

25 NPCs - Personagem 6 - Amenófis IV

Anhur recuava cada vez em direção da parede mais próxima, a cada golpe que o aasimar lhe dava. Nem conseguia mais manter a cimitarra ereta para aparar os golpes. Seu braço direito não aguentava o peso da arma e os cortes que tinha levado do adversário faziam seu corpo cambalear de dor. Seus crimes foram descobertos e ele seria preso. Condenado por roubo e espionagem. Mas sabia que não ia ser morto caso se entregasse a justiça.  O templo de Ísis era a salvaguarda que ele podia se render e não ser morto. Largou a arma.

"Eu me rendo. Imploro por misericórdia. Confessarei meus crimes e a quem eu sirvo... uuuurgh..."

O aasimar atravessou o ventre do espião com sua espada curta. Seu inimigo não receberia misericórdia. Não depois que todo o sofrimento que Anhur causou a esse vilarejo. Mas Amenófis IV, terceiro filho de uma família nobre, descendente distante do deus do Sol, sabia que matar alguém num templo sagrado era um crime hediondo nas terras de Mulhorand. Como imaginava, na velocidade de voo de uma íbis, a punição chegaria. Chegou logo depois que seu inimigo parou de tremer no chão, envolto numa poça de sangue, dedicando sua última força a tentar inutilmente retirar a lâmina que o atravessava. A punição estava em forma de alguém da sua espécie, vestindo uma armadura, cujo elmo trazia a cabeça do chacal, homenageando o deus da justiça.

"Amenófis IV, em nome dos deuses, ouça e cumpra o que o destino lhe determina. Por ter executado um mortal em solo sagrado, servirá como escravo durante 7 anos ao povo do vilarejo de Nuketh".

O filho distante do Deus-Sol sabia também que sua alma seria corrompida e ele nunca chegaria ao reino dos deuses pós-morte se não aceitasse sua pena. Ele ajoelhou-se de frente para o servo divino e agradeceu. Mesmo que tenha matado um espião corrupto que roubou a mina de ouro de Nuketh, mesmo que tenha salvo o vilarejo da escravidão. Ter levantado uma revolta popular contra soldados estrangeiros, que assassinaram grande parte da população masculina da região, não servia como atenuação da pena. Amenófis IV seria escravo, mesmo sendo herói.

***

Sete anos de trabalho na mina e no campo foram suportáveis ao aasimar devido ao apoio da vila de Nuketh, especialmente pela companhia e paixão que ele sentia pela clériga de Ísis, Tália.

Tália curava sua feridas do trabalho duro e de suas culpas da alma, que Amenófis carregava desde o momento que traiu os deuses que ele tanto amava. Com um dos únicos machos adultos sobreviventes da exploração de Anhur, o ex-governante da vila, e seus asseclas, as atividades braçais lhe eram destinadas todos os dias, o dia inteiro. À noite, se dedicava aos estudos de Ísis, a deusa da cura e da fertilidade, orientado por sua serva, antes sequestrada pelo inimigo, agora conselheira de Nádia, a líder da vila.

Após o término da servição, junto da liberdade, o aasimar tinha outros motivos a comemorar. Sua futura esposa estava grávida da primeira criança da vila recém libertada. Logo, as moradoras da vila ajudaram a organizar um casamento.

Regado por várias bebidas, Amenófis quase não teve nenhuma lembrança dessa cerimônia. Dias depois, quando ele tentava lembrar, sentia que algo nublava seus pensamentos, sensação que ele teve quando bebeu o vinho cerimonial antes do ritual do casamento. A única coisa que conseguia lembrar era de ter consumado seu casamento com Tália, num ritual desconhecido de sua deusa. Parecia que Tália tinha se metamorfoseado em várias mulheres enquanto faziam amor. O que deveria ser um momento de alegria, trazia a Amenófis uma dor incompreensível. Ele preferiu esquecer e nunca mais tocar nesse assunto.

No último mês de gravidez de Tália, Amenófis IV foi convocado a capital do reino. Seus dois irmãos mais velhos eram embaixadores no Ocidente e ele deveria acompanhá-los e aprender a governar. Em breve, o rei-deus poderia lhe conceder terras e riquezas no futuro, assim como seus irmãos receberam. Ele, que era um oficial antes da libertação de Nuketh, voltaria a nobreza num cargo muito mais importante. Sua felicidade inicial se desfez quando ele não conseguiu acompanhar o nascimento de sua filha, por ter sido enviado imediatamente a Cormyr.

Seis meses depois, ele voltou com o título de vice-rei da região da vila que ele salvou. Mas isso também não lhe trouxe felicidade. Ao reencontrar Tália, soube que sua filha recém nascida não teria sobrevivido as suas primeiras horas de vida. Sua esposa ficou doente logo depois da pera. Mesmo com seus próprios poderes de cura, ela não conseguia se curar. Amenófis, então, pediu ajuda dos melhores curandeiros e sacerdotes da região, mas nenhum deles conseguiu evitar que sua amada definhasse mais a cada dia. Um dia, ele sonhou com Ísis e acordou com seus poderes de cura. A deusa não revelou a missão que o aasimar deveria realizar, mas o nobre extraplanar entendeu que seu dom divino deveria curar Tália. Ele chorou e não entendeu porque seu poder não conseguia curar sua amada, mas a clériga exigiu que ele perdoasse sua patrona. Ele rezou agradecendo sua dádiva e a deusa o perdoou.

Numa noite chuvosa, a líder de Nuketh o convocou. O nobre assimar se enfureceu. Achava que era muita arrogância ser afastado do sua casa e dos cuidados de sua esposa para atender uma local, mesmo ela sendo uma das companhias na batalha da libertação.

Se ele achava que tinha sentido o mal, quando atravessou seu adversário no templo, agora ele se encontrava perdido para o mal, depois de ouvir as palavras de Nádia: "Lorde Amenófis IV, meu venerável vice-rei. As leis dos deuses dizem que não devo lhe faltar com a verdade. Portanto, peço desculpas se o que digo parecer uma tempestade de areia que castigue sua alma. Uma das minhas servas limpou o templo hoje, já que a saúde da senhora Tália não a permite que faça isso. Enquanto Mina limpava a despesa, ela derrubou um baú. Por sua curiosidade, ela leu os pergaminhos que haviam lá dentro. Desculpe-me, meu senhor, mas sua esposa não é sacerdotisa de Ísis, ela serve Ishtar, deusa dos nossos inimigos de Chessenta. Ela governava secretamente nossa terra, através de Anhur. E infelizmente, senhor, essa não é a única de suas manipulações. Sua filha está viva e foi entregue a agentes inimigos".

Ele não precisou ouvir mais, nem mesmo quando os pergaminhos lhe foram apresentados e reconheceu a letra da suposta sacerdotisa da deusa da cura. A raiva queimava sua mente. Tália teria que dizer a verdade. Quando voltou ao templo, ele precisou apenas olhar nos olhos da clériga para saber que ela era tinha lhe enganado, mesmo o amando. A dor de ser traído lhe deixou de joelhos. Amenófis IV se amaldiçoava enquanto via sua amada dando seus últimos suspiros de vida.

"Desculpe-me por ter enganado desde sempre, minha luz do sol. A morte veio cobrar todo o mal que causei secretamente a você, a este templo e a essa cidade. Nossa filha, a única coisa boa que talvez tenha restado entre nós, está viva e foi sequestrada por meus antigos mestres. Ela é a luz que seus deuses mandaram para lidar com a futura escuridão. Estou morrendo. Encontre-a, por favor".

Amenófis IV fechou os olhos de Tália e lhe fez uma prece. Após cremá-la mesmo debaixo da chuva, tradição mortuária do país inimigo, um raio o cegou. Quando voltou a enxergar, a deusa Ísis lhe apareceu, acompanhada de uma garotinha e lhe sussurrou: "Salve sua filha, salve a alma de sua esposa, encontre seu o próprio perdão, essa é sua missão".