quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Crônicas II - Campanha Lordes de Scornubel - Capítulo 1: "Areias do Passado" (parte 1)


Lordes de Scornubel é uma crônica baseada na aventura que eu narro no Cenário de Campanha Forgotten Realms. Esse cenário e alguns dos personagens citados têm seus direitos pertencentes a empresa Wizards of The Coast. Isso é um material feito por um fã para outros fãs, sem propósitos comerciais.

Aproximadamente 20 anos atrás, Helium, um jovem mercenário recém-saído da adolescência, tentava sobreviver num grupo de bandoleiros nas areias do deserto de Calim. Aquela dia o saque tinha sido proveitoso, vindo das riquezas de um rico mercador do norte, que se perdeu debaixo daquele sol inclemente.

Selûne, a lua, estava cheia no céu, quase como se estivesse acima do acampamento. Todos já dormiam embriagados com a vitória e era a vez de Helium vigiar. O velho Norman, um dos guias do deserto, tinha avisado que o tempo poderia piorar à noite, mas ninguém, nem mesmo o jovem bandoleiro, lhe deu atenção.

Depois de poucas horas de vigília, o tempo esfriou rapidamente e a lua cheia foi coberta por uma enorme nuvem negra. Helium circulava a fronteira nordeste do acampamento dos bandoleiros quando um duplo raio atingiu uma colina de areia há alguns metros de distância e trouxe por alguns segundos a visão de um pequeno bosque de palmeiras. Helium esfregou os olhos, pensando que não fazia sentido ele ter visto uma miragem, algo que o calor fazia no dia. Disse para si mesmo, "onde há palmeiras, há um oásis, mas nosso grupo teria visto esse lugar. Passamos a poucos metros dele. Quem eu quero enganar? Estou cansado e essa promete ser uma noite de muito frio e raios".

Um novo raio atingiu o chão, muito próximo do mercenário. Cego pelo clarão e derrubado no chão pela força da natureza, Helium conseguia enxergar aos poucos, enquanto o chiado dos seus ouvidos diminuía, os homens gritavam. O acampamento estava acordando, os animais de carga reclamavam; um vento forte chicoteava suas vestes. Até que veio um enorme urro e todo o restante dos sons cessaram. O jovem mercenário das areias se levantou com dificuldade, na direção de onde parecia ter vindo o grito que parecia vindo de um deus. De repente, a escuridão da noite se tornou luz branca e ele viu o corpo do deus: um redemoinho de areia que se estendia do chão aos céus. Ele deixou de sentir o chão, pois o deus-redemoinho o puxava nos seus braços de vento para si.

* * * * * * *

Chão firme. Nariz sentindo cheiro de sangue. Boca coberta de areia. Corpo dolorido, que o fez lembrar da brigas de ruas, brigas que o jovem Helium enfrentava nas ruas de Athkatla. Vindo de Amn para Calimshan pulando de caravana em caravana, buscando uma oportunidade de comer e ganhar peças de ouro brigando, nunca ele tinha se sentido antes tão destroçado. Com o apoio do braço direito bom - o esquerdo estava dormente e parecia fora de sua posição normal - o amniano se ergueu e viu onde estava, onde a tempestade de areia havia lhe deixado quebrado, mas vivo. Estava em uma câmara fracamente iluminada. a luz vinha de um pequeno buraco numa parede de areia, escorada num largo corredor de pedra. A entrada de uma ruína tomada pelo deserto.

Uma tosse com sangue acontecia a cada dez passos em direção à parede arenosa. O bandoleiro já tinha sofrido disso antes, por um golpe de maça recebido nas costas por um criador de camelo roubado. Dessa vez, Helium não teria como descontar a dor de uma ou duas costelas quebradas num alvo. Devia transformar essa dor em motivo para sair dali. Escavando com a mão, seu braço dormente acordou, trazendo mais dor ao esforço. O vento exterior não rugia tão alto como na noite anterior, mas trazia um cheiro de sangue, morte e um grito de dor.

"Aaaaaah, maldito Shebat, já não bastava feder como merda de camelo, agora... Aaaaaah, você está morto e estraçalhou minha perna. Na minha morte, terei minha... aaaaah, perna doí como os setes infernos, aaaaah... Na morte, terei minha perna de volta e te estriparei como um porco. É isso que você... aaaaaah, mereceeee!"

Helium conseguia distinguir claramente a voz do velho Norman. "Velho, estou vivo, mas preso. Chego já em você. Tem alguém do bando contigo?"

"Helium, é você? Não consigo te ver. Aquele furúnculo andante do Shebat foi arremessado em mim durante a tempestade. Minha perna esquerda está debaixo do corpo morto dele e o que sobrou.... Aaaah dela é uma poça maldita de carne e sangue. O laço que eu fiz nela diminuiu o sangramento, mas não consigo sair debaixo do corpo seboso, aaaaaah. Preciso de ajuda".

O bandoleiro se esforçou para sair de sua armadilha arenosa, mas demorou vários minutos ou horas para isso, ele não sabia dizer. O calor e a dor o confundiam. Quando a parede de areia desmoronou e possibilitou a saída do jovem, Norman já não reclamava mais de dor. Helium o encontrou bastante pálido, o sangramento da perna do velho guia do deserto banhava o solo. Colocou o cadáver de Shebat de lado, o cheiro de morte superando o fedor corporal. Um suspiro do guia o fez se aproximar. Não havia nada mais a fazer, apenas ouvir as últimas palavras de um moribundo.

 "Veja todos esses mortos na areia. Sobreviva. Não seja mais uma refeição dos abutres do deserto, nem que as serpentes do deserto habitem seu crânio seco. Faça por merecer a benção de Talos, o deus-senhor da tempestade. Deixe o sol me torrar e as areias se alimentarem do meu sangue." A morte de Norman veio logo.

O pôr do sol chegou depois que o corpo de Norman estava enterrado nas areias. Helium sabia onde estava, aquela parte de deserto meio rochoso, coberto de corpos de homens e animais mortos tinha palmeiras e um pequeno lago de lama. Era o oásis visto na noite de tormenta. A trilha de destruição causada pelo redemoinho, que vinha do seu antigo acampamento até ali foi a confirmação. O vento tinha revelado a ruína, que ele usaria como abrigo. Conseguiu tirar dos corpos um pouco de alimento e água. Tinha que ser forte e realmente abençoado por Talos, pois para chegar na cidade mais próxima, teria que sobreviver ao que o céu noturno trazia: uma nova noite de tempestade de areia.

* * * * * * *

Dois guardas entediados disputavam uma disputa de funda usando como alvo a marcação de pedra que simbolizava o início da chamada "estrada do deserto Calim". Um deles estava para perder duas dezenas de peças de cobre e puxou uma conversa, que talvez atrapalhasse seu adversário de boa mira.

"Caleb, anda pouco movimentado. Estou aqui de guarda por três tardes e não vi nenhum sinal de caravana ou viajantes chegando."

"Olha, Tariff, pelo o que o soube, pelo menos três caravanas..." Caleb, mesmo de 50 metros de distância, acertou o topo da marcação. Tariff, desanimado, desamarrava seu saquinho de cobre. "...Ganhei. Hahaha! Pelo menos cinco caravanas foram destruídas pelas tempestades noturnas nessa última dezena de dias. As rondas só encontram corpos mortos e coisas destruídas. Mais uma partida?".

"Não, já perdi meu soldo da semana. Você paga pelo menos um copo daquele mijo de bode que você chama de cerveja, no fim do turno." De uma duna de areia a duzentos metros de distância, onde a última marcação de pedra era praticamente engolida pelas areias, um homem queimado pelo sol, coberto de farrapos, trazendo faixas sujas imobilizando seu braço, marchava em direção aos portões da cidade. "Vem um pobre coitado da estrada. Veremos quem é."

"Gente na estrada. Quem sabe, sua sorte mudou, Tariff. Depois de sabermos quem é o andarilho, vamos começar uma nova partida de arremesso, de mais longe, valendo seu soldo da próxima semana?" Tariff ignorou Caleb, montou em seu camelo e avançou em direção do andarilho.

Caleb adiantou seu camelo e se aproximou do estranho antes de Tariff. "Quem é você, andarilho? De onde vem e qual é o motivo de sua passagem por nossa cidade?"

O forasteiro parou e prontamente respondeu: "Eu sou Helium, aquele que sobreviveu a Tempestade e vim buscar homens dispostos a viver no oásis que Lorde Talos me deu!"


Próxima semana, "Areias do Passado", parte 2. A parte 1 foi baseada nos backgrounds de 3 personagens da campanha "Lorde de Scornubel".

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Metajogo II - Interpretação


Metajogo - Para aqueles assuntos de regras de RPG, mas principalmente, o além das regras.


Como eu resumi muito tempo atrás... Esqueceu? Está aqui!!
...RPG, num esquema seria:

(Interpretação + Jogo + Imaginação) = Diversão.

Falemos sobre o 1º item, então:

INTERPRETAÇÃO

Querendo se vestir como seu personagem? É legal, mas é opcional!

Sendo o mais resumido possível, na minha opinião, interpretar é arte de representar um personagem, seja no teatro, na televisão, num filme - alguns interpretam na vida, mas não vem ao caso - e no caso do RPG, o jogador é o intérprete do seu personagem.

Sim, RolePlayingGame tem muitas semelhanças com o teatro, mas é diferente de um. Para entender melhor, vamos as diferenças. Peço logo minhas desculpas aos atores, diretores e teatrólogos caso eu escreva alguma besteira sobre o teatro. Aqui, as opiniões são no senso comum mesmo!

A) No Teatro, as apresentações são baseadas numa peça, num roteiro.
B) Os personagens da peça ou da obra são atores ou figurantes.
C) Existem os protagonistas (personagens principais) e os antagonistas (personagens cujas trajetórias interferem no desenvolvimento dos personagens principais).
D) Cada grande obra representada no teatro tem por detrás dela um escritor, um roteirista (caso ela seja adaptada de um livro) e um diretor.
E) Toda apresentação tem começo, meio e fim imutável.
F) Como é imutável, a não ser que seja uma obra que sejam permitidas improvisos, todas as apresentações vão seguir o mesmo roteiro.
G) Na peça, junto com os atores, estão lá os cenários, os bastidores, os efeitos sonoros, os jogos de luzes e outras ferramentas.
H) O teatro é para ser visto. É feito para fazer sua audiência, seus espectadores rirem, chorarem, etc, em resumo, se emocionarem e se conectarem de alguma forma com a obra.

Beleza, entendi. E agora, como funciona no RPG?

1) No RPG, as apresentações são Aventuras baseadas numa peça, num roteiro. Os Rpgistas chamam essa peça ou roteiro de Campanha.
2) Os personagens da obra são os personagens criadas pelos Jogadores e pelo Narrador/Mestre da campanha.
3) Grande parte dos Personagens Principais da história são os interpretados pelos jogadores. Um ou alguns jogadores podem ser temporariamente ou permanentemente o antagonista da aventura, mas normalmente, isso fica por conta do Narrador, assim como personagens aliados e figurantes da história, chamados de NPCs (no inglês, No Player's Characters; no nosso bom português, numa tradução literal, personagens que não são feitos pelos jogadores). NPCs são outros personagens da história, cuja administração fica por conta do Narrador.
4) O Narrador tem o papel conjunto de escritor - ele que decide a temática da aventura e da campanha - de roteirista - ele escolhe qual sistema de regra e cenário empregar, aqueles mais adequados para a campanha - e diretor - baseado nas ações dos jogadores, escolhe o caminho mais adequado para onde a aventura deve prosseguir.
5) Toda aventura tem seu início, situações de clímax e um final provavelmente planejado. O importante é que tudo isso é mutável. Qualquer aventura pode mudar completamente em qualquer ponto, já que a história uma construção tanto do Narrador quanto dos jogadores; depende das ações dos jogadores a sequência; a sorte e/ou azar (prefiro chamar de aleatoriedade) também interferem no que acontece.
6) Logo, a história de toda aventura muda, se transforma. Se a história for boa, a aventura sempre é diferente.
7) O cenário é a IMAGINAÇÃO (falaremos nela mais tarde), tanto dos jogadores, quanto do Narrador. Claro que o narrador é o principal responsável, por ser ele a figura que propõe a aventura que os jogadores devem participar (play em inglês, mesma palavra usada para encenar uma peça). É função também do Narrador trabalhar com as outras ferramentas, podendo sempre contar com a participação e colaboração dos jogadores.
8) A audiência são os próprios participantes do grupo de RPG, ou seja, jogadores e narrador. Eles vivenciam a emoção de representar e assistir a se próprio atuando dentro da aventura.

A analogia RPG - Teatro foi boa? Deu para entender bem? Faça seu comentário, dê sua opinião, ajude a complementar esse quadro comparativo. Esse site é feito contando com sua participação!

Na próxima semana, falaremos sobre JOGO, a parte lúdica do RPG!


segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Histórias do Bardo II - "Um Homem e sua Mula"


Histórias do Bardo é uma coletânea de histórias engraçadas (ou trágicas para os seus participantes) ouvidas ou presenciadas por mim, de fatos ocorridos em sessões de RPG.

Nossa história de hoje fala de um homem e sua dedicação à sua companheira de aventuras, a Mula...

Resumidamente, a aventura se tratava de impedir que um Paladino fosse usado como ponte de entrada para um exército maligno comandados pelos Pecados Capitais dominassem o mundo. Dito isto, o começo da aventura tratava-se da reunião de nossos heróis, na primeira tentativa de impedir a captura do paladino para esse nefasto fim. Entre nossos heróis, estava ele, Hugo (nome do jogador mesmo, porque não lembro do nome do personagem, fica como homenagem, hahaha!) com sua mula, carregada dos seus equipamentos de aventura.

Logo depois de ser salvo, o Paladino os convida para passarem a noite na fortaleza de sua família, convite aceito pelos personagens, mas Hugo apresentou sua primeira ressalva: "Aceito ir se o lugar tiver onde guardar a mula". Receber a notícia que tinha lugar para a mula não bastou. Enquanto os personagens se aconchegavam em seus quartos, ele inspecionou minuciosamente o local onde a mula ficará guardada, "porque ela era muito importante, praticamente membro da família dele".

Infelizmente os 7 membros da família do paladino (que estava dominada por cada um dos sete pecados capitais), enquanto ele esteve fora, explorou o máximo que pode de uma forma maligna, a vila próxima do castelo, provocando a revolta dos aldeões, que iam invadir e se vingar da família. No jantar, o Paladino foi envenenado na frente dos heróis e os heróis foram impedidos por alguns membros da família de salvá-lo. Enquanto os heróis lutavam, o paladino foi levado para o templo-tumba da família, para um sacrifício. Toda essa confusão acontecendo enquanto a multidão tentava invadir a fortaleza.

Tática do grupo de heróis para resolver a armadilha: Impedir o ritual, salvar o corpo do paladino e apaziguar a multidão. Tática de Hugo: SALVAR A MULA primeiro antes de seguir a tática do grupo.

Logo, o grupo foi o primeiro a passar pelos guardas do templo - eles estavam desavisados do que estava acontecendo, mas foram facilmente convencidos a deixar eles entrarem. Já Hugo chegou atrasado, por ter resgatado sua mula. O problema que ele queria entrar no templo com a mula, o que era um sacrilégio. Mesmo com os guardas explicando isso, a honra de Hugo e a vida de sua mula estavam em jogo. Então, ele entrou em combate com os guardas e os derrotou.

Enquanto isso, as forças dos sete pecados mortais mandaram soldados goblinóides atacarem os heróis no templo. Quem estava lá depois de derrotar dois guardas inocentes e ficou para enfrentar esses soldados? Hugo e sua mula. Talvez transtornado pelo combate anterior e vendo que 6 soldados seriam um desafio para ele, Hugo decidiu sacrificar sua mula, tocando fogo nela, "pois ela servirá com uma barreira incendiária!" O deus das mulas deve ter ouvido esse abuso e quando o jogador foi tacar fogo na coitada, os dados lhe deram uma falha crítica.

Moral da História: Todo homem coloca chamas em si mesmo quando abandona o amor por sua mula querida!